quarta-feira, 26 de agosto de 2015

CONFISSÕES DOS QUE ESPERAM

(...) Eu acabara de chegar à Ilha de São Miguel – Açores, era em finais de dezembro de 2003. Na residência universitária que me abrigou só estavam 5 dos 11 portugueses prestes a irem para o continente ou ilhas vizinhas, já que estávamos no período de férias e véspera de Natal. Na casa ao lado, mais dois timorenses recém-chegados seriam as pessoas que eu veria nos próximos dias. Recebi um telefonema na casa informando sobre um convite para passar o natal na casa de uma senhora da comunidade Cristã das Capelas, uma freguesia (região) pacata, porém de uma beleza natural exuberante como toda a ilha possui. Foi então que por volta do meio dia do dia 25 a Sra. Fernandina apareceu como combinado e nos levou para as Capelas, incluindo os dois timorenses. Assim que chegamos à aldeia, fomos logo apresentados ao grupo folclórico e participamos das habituais cerimônias festivas do “menino mija” (tradição carinhosa de anunciar o nascimento de Jesus, passando de porta em porta da comunidade com intuito de beber uma pinguinha, geralmente licores, como sendo o líquido santo, por assim dizer). Já pela noite, depois de alguns “mijos” do menino e uma bendita mesa farta, a Sra. Fernandina me perguntou de qual casa eu era precisamente. Se eu era da casa de Pedro, de Miguel ou de Isabel. No momento não entendi muito bem e respondi como sempre que era filho de um astuto torneiro mecânico e uma caprichosa costureira. Ela, no entanto insistia dizendo que eu tinha os fios loiros de Miguel, os olhos verdes de Isabel e a peitoral de Pedro. No decorrer da conversa cheguei à conclusão que ela falava da família real portuguesa que vivera no Brasil. Quando eu sequer vi de perto a Coroa Imperial em Petrópolis. Enquanto isso os timorenses entoavam orgulhosos cânticos de independência do Timor Leste. Seis dias se passaram e novamente fomos convidados pela Sra. Fernandina a reunirmos para a virada do ano, só que dessa vez, em Ponta Delgada (Capital da ilha). Ela nos levou à uma fraternidade ou mosteiro, uma casa de freis e monges. Eram 7 ao todo, muito simpáticos, alegres, festivos, cantarolando com violas e flautas; e sem fugir à regra doadores dos melhores vinhos caseiros. Antes das badaladas da meia noite do dia 1 do ano 4, quando nos dirigíamos para a parte alta no terraço para ver os fogos de artifício, um dos freis colocou sua mão em meu queixo como se mexesse ligeiramente dois eixos em cruz nos 4 pontos extremos do pescoço e num breve exame das faces, testa e pomo de Adão ele me disse assim: SEBÁ.
(...) Eu tinha 20 anos e ali começava a conhecer o reino.

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