sexta-feira, 30 de maio de 2014

HÁ TREVO



Será um livro destacado
Não fundido ao centro
Como folhas soltas ao mar ou ao vento  
Como as tábuas flutuantes do naufrágio de um navio
Chegando à praia encontrarão mãos que colhem e apreciam
Seco à luz de velas logo colam, guardam ou reenviam
Dentro de outros botes ou botellas vazias
E quando recebidos os textos em outros continentes  
Verão que nas costas há desenhos
São resquícios, desafios, pedaços do mapa
Do senhor de Monte Cristo

quinta-feira, 29 de maio de 2014

GANGORRA

Ver o balanço das árvores descansa
Das noites de insônias conhecidas
Do latejar antigo deste lombo moço
Fogem de mim, pobre de mim
Que não entendo seus olhares
Cabisbaixas ficam a meditar se sim
Se aproximo tremem seus calcanhares
Não espero que venham me provar por vontade
Justamente coragem o que peço de súbito
Num instante apenas descubro a meta
Com a bagagem transbordante de vivência
Não há prisão melhor que o meu abraço
Há aconchego mesmo quando andantes nos terraços
É tão fácil e intrigante não ter alguém a toda hora
Mais do que alguém que me queira bem como ninguém
Saber de mim eu sei, saber de nós é um mistério além

SURREAL


Ei! Psiu! Ou! Brasil! É a Copa do Mundo, cara! A arquibancada é montada na calçada. Tem rua aí? Faz o seguinte, enche a boca de arroz e feijão. Quem é do norte pega um sol no litoral e bebe água branca e de sabor. Quem é do sul caça uns bois e põe na brasa para o país. Há muito tempo atrás a novidade era o espelho, hoje você consegue se ver com uma máquina que levantada a mão te faz crer ter mais que a própria imagem. Você tem o planalto, o Palácio, deserto, fóssil, pedra e muita mata. Tem gente, tem muita gente. Faz assim, distribui, abre os braços, dá espaço. Depois de mastigar, pinta a cara, vê o jogo, ri ou chora – como diz o Samba – e tira aquela foto que te faz ver quem você é. Brasileiro, pois. Ou! Você nasceu aí cara, seu sangue é misturado, sua terra é gigantesca, tem cana, café, tem até gente grotesca. Existe o mal, isso é muito mal. Ei! Pense no bem, convença os vilões a estenderem as mãos sem te roubarem a alma, sem te apontarem armas, caso contrário, jogue bola com o couro deles. Calma aí! Não é para seguir a risca o sermão da montanha. Já rezou? Olha que paz. Pode pedir e agradecer até ao sol que Deus aceita. Eu já pesquei. Aliás, do prato verde e amarelo eu comi arroz com caldo que de certa forma o país deu aos meus pais que me deram a mim. Não posso cuspir na rapa do tacho, de forma alguma! Eu, aqui, brigo com quem cospe no chão, com quem aparece na televisão como bonecos de Madame Tussauds, e mesmo assim sou grato. Aos hospitais abarrotados de gente que me atenderam, às escolas sem horas e professores mansinhos, e mais, sou grato por conseguir viver neste Mundo quase caos. Eu sei quem sou sem qualquer espelho e sei onde estou porque cativo este apego. Não chamo mais! Eu posso muito mais. Mas, só farei quando acabar o jogo. E olha, já tá rolando há muito tempo. Assenta aí, vê ou faz alguma coisa mais que a ingratidão. Só um pouco menos de indignação. Se piorar eu vou morar no Vaticano, juro por Deus que vou. Até de lá reclamam. Não posso fazer o mesmo. Lá o chão é limpo e a colher é funda. Sim, só depois que acabar o jogo.

IMUNDÍCIE



Pouco se diz mais que olá
O calendário não se aplica
O cabeça não faz
Não faz mais que abrir e fechar
Coisas novas se perdem
O chão é um chiqueiro
Nos tacos soltos tropeça até o gato
É a república estudantil (retrato)
Mas, ficam os que vieram
Para longe chegar de navio
Ensinando aos que vão
Carregando seus empecilhos
Num silêncio ou num estalo  
Pois de cedo o berço aprende
É de seda a vestimenta de minha Dama
Não olhe cacos, restos e vidros embaçados
Sabeis que é na torre mais além
Que as janelas mais altas
São os melhores corredores dos bons ares  

terça-feira, 27 de maio de 2014

QUAIXCASÉ



Atrás de ti eu subo a serra
Margeio o rio em suas curvas
Te trago ao mar e junto as pedras
Ser missionário, ser cumpridor
Sozinho apenas sinto, anestesia
Engano a dor de querer tanto
Conjunto belo, um mundo novo
Anéis que cabem em teu sorriso
O tempo passa, encontros falham
Não tenho medo, medo não tenha
Posso partir, sem ti, mas ficarei bem aqui


segunda-feira, 26 de maio de 2014

INVOCO



Eu escrevo linhas sem fim mas não vêem como, quanto, para quem e qual fim
Eu sinto o cheiro do alecrim mas não sabem qual é o campo com os dentes de leão
Se já moldado foi o ferro em fogo, eu sou o quarto, o que sabe sobre e vive
Mãe, costura a redoma de vidro da rosa do pequeno príncipe que o cometa passará
Pai, seu jeito forte nos faz rir, seu peito extenso é nosso degrau que o senhor subiu
Irmãos, casa e sangue com honras e glórias, lutas e vitórias, aguardam a hora

FAROL, SINAL



Agora estou em trapos, com o calçado raso
A cama está no chão para esticar o esqueleto
Enquanto a luz do teto pisca e não queima
As mariposas atraídas sofrem o pulo do gato
Tudo é energia no recanto deste quarto
E conto as horas à espera de respostas
Sobre tudo aquilo que bem feito afirmei
Entendo a ira dos que param e pensam
Que a semente da maçã é instantânea
Demora, pois, brotar, crescer, cuidar, colher
O mesmo que um país fundado avançar sem freios
Forte enfrento a crucial hora da solidão
Quando instala a lembrança do passado majestoso
Serenas gotas pingam prantos de saudade
Mas depois agarro bravo meus panos
Traço planos todo o tempo como agora
Para viver feliz e fazer feliz a companhia

MEMÓRIAS DE UM IDO (S. MIGUEL/AÇORES - 2004)

Acredito: Depois que você entra no paraíso você descobre tudo aquilo que projetava e o que realmente existia. Além disso o que haveria ou nã...