quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

QUASE TUDO É POSSÍVEL

*
Já no Tom Jobim, uma hora antes das 8 horas do primeiro trecho, sentei-me numa lanchonete para comer e beber os últimos açúcares e sais do Brasil. Da caixinha de som só saía uma música, repetida mais de 30 vezes cantada em inglês pelo Caetano Veloso e não era o Jokerman do Bob Dylan. Cuidadosamente, treinando o meu imperativo (!), pedi às meninas atendentes por favor que trocasse a música, pois gostamos todos do Caetano, mas a mesma música em inglês 30 vezes, é dose. Parece que no saguão de embarque - talvez por ser novinho com um carpete bom para se andar - a nossa voz se destaca mais. Há um certo efeito de estúdio e quando disse isso às meninas, três outras mesas sorriram para mim em apoio, pois notaram a repetição da música. Deu certo pois ao vir do banheiro já estava sintonizado numa rádio. Na chegada ao Marrocos reconhecera uma das pessoas que me vira pedir para mudar a música e uma das magias dos brasileiros é fazer "amizades" em viagens. Fomos em conversa até Lisboa. Mas, parece que em Portugal minha voz fica mais rouca que o habitual e o tal efeito estúdio passa para o efeito obras e construção, pois tenho que falar mais alto, ainda contendo o imperativo (!). Ao entrar no metrô com três bagagens, aquela galera me prensou sem dó nas paredes do azulzinho (cor interna dos vagões). É uma das características das metrópoles, não é? A massa em circulação frenética. E juro que disse a uma das senhoras que estava bem próxima a mim, que bem podiam inventar um metrô de dois andares, para caber mais pessoas, uma vez que a altura e a profundidade das galerias subterrâneas proporcionam tal feito de engenharia e arquitetura. Ainda disse a ela: "Se construíram um elevador que liga a parte baixa à parte alta, por que não um metrô de dois andares?". Ao chegar em Almada após cruzar o Tejo num barco vai e vem em 10 minutos, senti um cheiro tão bom a peixe que parecia estar nas festas de São João do Porto ou nos atuneiros do grupo central dos Açores. Na verdade estava nos braços da Capital, na foz do Tejo, numa das trompas dos úteros do oceano atlântico, no país famoso pelos frutos do mar. Mas acabei por me sentar numa pastelaria onde esperaria meu velho amigo belga a beber uma Sagres long-neck por 1 euro. E eu com um tom de atenção às facilidades do consumo de álcool no Brasil. Após a chegada do Geoffroy conversamos bastante e reparei que havia uma velhota sem dentes bebendo uma sopa de ervilhas sempre atenta às minhas falas. Num momento disse que gostaria de tentar publicar livros ao estilo Camões e Pessoa por mais que minhas escritas sejam mais simples e nada floreadas e complexas como tais. Foi então que a senhora fitou-me mais ainda, como se esticasse o pescoço pra ver bem quem era esse, ou talvez ouvir alguma declamação minha para fazer algum juízo. Na saída da pastelaria despedi-me de todos e juro que lhe disse, precisamente a ela: "Agora, só falta Dom Sebastião voltar!". Então, pude ver sua "canjica aberta" num sorriso eufórico excitada com a minha eloquência. Na manhã seguinte fui à beira Tejo e a Marinha estava em peso com seus navios de guerra. Pensei comigo: "Tanto quero servir a Marinha...". E é verdade que escrevi-lhes anos atrás prontificando-me, porém eles me disseram que é fator crucial ser cidadão natural do país para o ingresso. E ela ali cinza, com helicópteros em exercícios, armada, imponente, servindo-me. Eu muito gostaria que o título desse texto fosse: TUDO É POSSÍVEL!
*

Nenhum comentário:

PALAVRAS DO BRASIL

Uai, e Cataguases? Cataguases é terra de gente boa, também. Escrito sem medo ou números classificatórios, exceto títulos de percursos presen...